quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Presos denunciam tortura com cabo de vassoura, formigueiro e balas de borracha no Pará

O governo federal e o estadual negam que houve excessos

MPF reúne relatos, imagens e vídeos apontando indícios de torturas e maus tratos durante intervenção federal em presídios do Pará. — Foto: Reprodução / MPF
MPF reúne relatos, imagens e vídeos apontando indícios de torturas e maus tratos durante intervenção federal em presídios do Pará

"Parece que fizeram uma seleção de psicopatas", diz um agente prisional do Pará para descrever a atuação da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP), que iniciou a atuação em julho deste ano no estado, após o massacre em Altamira.
A força-tarefa foi enviada pelo ministro Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública) a pedido do governador Helder Barbalho, após um massacre que resultou na morte de 62 presos em um presídio de Altamira, no sudoeste do Pará. Moro disse em rede social que a força-tarefa faz bom trabalho, "retomando o controle dos presídios que era do Comando Vermelho". Na terça, o presidente Jair Bolsonaro, questionado a respeito, pediu aos jornalistas que parassem "de perguntar besteira".
O resultado das investigações realizadas pelo MPF inclui violência física, tortura, privação de sono e de alimentação e casos de abuso sexual. Tanto o governo federal quanto o estadual negam que houve excessos.
No Complexo Penitenciário de Santa Izabel, na região metropolitana, foram relatados casos de violência física e moral, com uso de spray de pimenta; não fornecimento de comida, itens de higiene pessoal e de acesso a assistência à saúde; e proibição de contato entre detentos com a família e advogados.
Em outra casa penal, o Centro de Reeducação Feminino de Ananindeua, o relatório afirma que uma detenta teria abortado em razão de agressões físicas; outra perdeu visão temporariamente por causa do uso abusivo de spray de pimenta. As detentas, segundo os relatos, foram colocadas em formigueiro, em locais com fezes de ratos; e foram obrigadas a usar apenas roupas íntimas e a não irem ao banheiro.

Complexo Prisional de Santa Izabel. — Foto: Oswaldo Forte/O Liberal
Complexo Prisional de Santa Izabel

Para elaborar a ação contra a União e o Estado do Pará, os procuradores ouviram detentos, familiares de presos e servidores do sistema penitenciário, além de representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que realizaram inspeções nas casas penais do estado, e do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNCT).
A maioria dos relatos ocorreram no Complexo Penitenciário de Santa Izabel, na região metropolitana de Belém. Os detentos foram amontoados em celas, sem água, sem comida e usando apenas roupas íntimas. Os presos relatam também que o ambiente é "completamente insalubre". Eles afirmam que foram obrigados a realizar necessidades fisiológicas no local e têm de dormir cobertos por fezes e urina.

 Detento mostra marcas da agressão feitas por agentes da Força-Tarefa penitenciária no Pará — Foto: Ministério Público Federal
Detento mostra marcas da agressão feitas por agentes da Força-Tarefa penitenciária no Pará

"Temos que comer comida do chão, que é coberto de fezes. Isso é desumano".
Entre as humilhações relatadas pelos presos está a agressão a um deficiente físico. "Tem um que faltava uma perna, e davam rasteira nele. Eles (agentes federais) mandaram um rapaz subir a escada de quatro", relatou outro preso.

 Preso com marcas de tiros de balas de borracha no Pará — Foto: Ministério Público Federal
Preso com marcas de tiros de balas de borracha no Pará

Mulher denuncia suposta tortura dentro do Centro de Recuperação Feminino em Ananindeua

Presas amontoadas no Centro de Recuperação de Ananindeua no Pará — Foto: Minsitério Público Federal
Presas amontoadas no Centro de Recuperação de Ananindeua no Pará

Abusos sexuais - Os relatos do presídio de Santa Izabel também envolvem abusos sexuais. Em um dos casos, agentes federais e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) teriam inserido o cabo de uma arma no ânus de um detento. Segundo o preso que relatou o caso, a vítima precisou ser atendida por uma ambulância.
Os abusos também aconteciam dentro das celas, segundo os relatos. Os presos estariam sendo obrigados a se beijar e a tocar nas partes íntimas uns dos outros durante revistas, realizadas diariamente. Detentos contam que os agentes também introduziam materiais menores, ou o dedo, no ânus de alguns presos.
O CRF de Ananindeua, na região metropolitana de Belém, foi vistoriado após denúncias de maus tratos em ação do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) para retomada de controle da unidade. De acordo com os parentes, as presas foram amontoadas em celas superlotadas e foram agredidas diariamente, em setembro deste ano.
Uma inspeção de cárcere, realizada no dia 12 de setembro por representantes da OAB-PA e da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), constatou que as detentas estavam sendo obrigadas a sentar em uma quadra repleta de urina e fezes de rato. A comissão também aponta que, em vários momentos, as presas foram forçadas a ficar nuas em frente a agentes federais homens.
A OAB-PA também relata que mulheres em período menstrual são forçadas a ficar sem absorventes íntimos. Em um dos casos, a OAB cita que detentas foram colocadas sentadas em cima de formigueiros dentro de um pavilhão.

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