sábado, 18 de novembro de 2023

Padre suspeito de desviar R$ 140 milhões de hospital na PB ostentava vida de luxo

Egídio Neto, de 56 anos, passou a ostentar vida de luxo na última década, com 29 imóveis, carros, adega com bebidas caras e até custeando faculdade de Medicina, segundo o MP

Padre Egídio, preso em João Pessoa (PB), suspeito de ter feito desvios milionários em instituição filantrópica

"Uma espécie de farra com o dinheiro público", definiu a promotoria do Ministério Público da Paraíba, em trecho da denúncia apresentada contra o padre Egídio de Carvalho Neto, de 56 anos. O ex-presidente do Instituto São José, responsável por gerir o Hospital Padre Zé, em João Pessoa (PB), está preso, acusado de ter chefiado um esquema de desvio e lavagem de dinheiro público por pelo menos dez anos à frente da instituição filantrópica. Enquanto a unidade de saúde operava com dificuldades e acumulava cada vez mais dívidas, deixando desamparados pacientes em situação de vulnerabilidade, o líder religioso teria tocado um gabinete de corrupção que lhe garantiu uma vida de luxo e ostentação.
Nesta sexta-feira, o religioso teve a prisão preventiva mantida após audiência de custódia e seguiu para a Penitenciária Especial do Valentina de Figueiredo. As investigações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) elencam que o padre, durante todo este período:

- Adquiriu 29 imóveis luxuosos, em estados como Paraíba, Pernambuco e São Paulo.

- Investiu em projetos de reforma e arquitetônicos.

- Quitou dívidas com dinheiro do instituto.

- Comprou ao menos dois carros considerados de alto padrão.

- Fez questão de mobiliar suas casas com obras de arte e relíquias religiosas que eram adquiridas em nome do hospital.

- Esbanjava adegas com um "sem número" de bebidas alcoólicas, com média de R$ 1 mil cada.

- Pagou a faculdade de Medicina do sobrinho em São Paulo, com mensalidades de R$ 13 mil.

- Levava uma vida incompatível com o salário de cerca de R$ 15 mil. Elevou seu rendimento mensal médio para R$ 140 mil.

Desvio de R$ 363 mil em aparelhos para tratamento de Covid-19

Um dos episódios que mais chamaram atenção dos promotores teria acontecido em 2021, em plena pandemia da Covid-19. Uma auditoria feita recentemente pela atual gestão do Hospital Padre Zé descobriu que Egídio teria autorizado a compra de 38 monitores multiparamétricos — essenciais para o tratamento de pessoas com Síndrome Respiratória Aguda Grave —, no valor de R$ 363,9 mil, com recursos adquiridos por meio de convênio com a prefeitura de João Pessoa.
Os aparelhos, que tratariam pacientes pobres com Covid-19, nunca teriam sido entregues.

Adegas gourmet - As investigações também apontam a obsessão do religioso por colecionar bebidas alcoólicas de luxo. A promotoria narra que, na casa de Egídio, encontraram adegas gourmet contendo garrafas de vinhos, espumantes e champanhes.
Apenas entre 2022 e 2023, o levantamento aponta que o padre teria pago mais de R$ 120 mil em bebidas alcoólicas, sempre à mesma distribuidora. Uma perícia no celular do religioso mostrou que ele tinha como um dos contatos salvos uma "consultora de vinhos", com quem conversava com frequência.

Artigos de luxo - A denúncia aponta também gastos elevados com a obtenção de obras de arte e relíquias religiosas "de elevados valores". Estima-se que, entre 2022 e 2023, Egídio tenha desviado cerca de R$ 350 mil com este tipo de item. Tudo saía da conta da Ação Social Arquidiocesana (ASA).
Em um único ateliê, ele teria autorizado a compra de R$ 80,4 mil em quadros. No entanto, em visita às dependências do Hospital Padre Zé, os promotores acharam apenas 11 peças, incompatíveis com o valor.

Faculdade do sobrinho - As investigações apontam ainda que, embora a renda mensal de Egídio não ultrapasse os R$ 16 mil, há indícios de que ele pagava o curso de Medicina do sobrinho, na Universidade Cidade de São Paulo (Unicid), cuja mensalidade cobrada por mês era de cerca de R$ 13 mil. Em perícia no celular do padre, os investigadores encontraram uma conversa, onde o jovem pergunta ao tio: "Conseguiu pagar o boleto deste mês?", e ele responde que "sim". Para comprovar que de fato o garoto não teria condições de arcar com os valores daquela faculdade, o Gaeco apurou que, em 2020, o rapaz era beneficiário do auxílio emergencial do governo federal.
Conforme a investigação do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público da Paraíba, as verbas desviadas seriam destinadas a programas sociais como distribuição de refeições a moradores de rua, amparo a famílias refugiadas da Venezuela, apoio a pacientes em pós-alta hospitalar, realização de cursos profissionalizantes, preparação de alunos para o Exame Nacional de Ensino Médio e cuidados a pacientes com Aids.
Os desvios, segundo o órgão acusador, teriam comprometido gravemente o atendimento prestado pelo Hospital Padre Zé às populações carentes e necessitadas. Em nota, a Arquidiocese da Paraíba informou que colabora "integralmente com as investigações em curso, respeitando o segredo de justiça estabelecido pelas autoridades competentes". E acrescentou que padre Egídio tem advogado próprio, sendo ele responsável pela defesa e interesses de seu cliente.
A Arquidiocese da Paraíba disse ainda que um processo Canônico foi instaurado em 27 de setembro deste ano "e está seguindo seus trâmites normais". 

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